Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

(in)sensatez

por Catarina Duarte

(in)sensatez

por Catarina Duarte

Qua | 31.05.17

Estereótipos, sim; discriminação, não!

Catarina Duarte

Fico sempre com a ideia que nos culpamos demasiado. O mundo está mais exigente, eu sei, e nós, bom, nós acabamos por ir a reboque: replicamos essa exigência nos nossos comportamentos e exigimos que os outros atuem sob a mesma bitola.

 

Somos pessoas cheias de complexos e, pior, encerramos em nós toda a complexidade do mundo. Com mentes repletas de recortes, pensamos e repensamos sobre a melhor forma de dizer e de estruturar o nosso raciocínio para não magoar ninguém. Moldamos o nosso discurso, aplicamos aquele lápis azul de forma real e certeira, para não beliscar maiorias e, especialmente, minorias.

 

Queremos ensinar tudo direitinho aos nossos filhos, para que sejam pessoas de temperamento irrepreensível. Preparamos logo o sermão para quando alguém desenha, numa conversa casual, uma história com alguns estereótipos – os olhos tornam-se crispados e da nossa boca sai – sempre - um bafo de fumo. Juro que já vi acontecer!

 

Tentarmos ser melhores pessoas não significa que tenhamos de ser tão exigentes connosco.

 

Calma, malta! Os estereótipos são normais. Todos nós os temos, não faz sentido que os tenhamos que esconder, que tenhamos que limar as frases ou amanteigar as palavras! Aliás, são os estereótipos que fazem, por exemplo, muito do humor que vemos e apreciamos! Pensem nisto!

 

A questão – a grande questão - é apenas a discriminação. A discriminação, porque é alicerçada na falta de respeito pelo próximo, é que deve ser combatida. Se ela advém dos estereótipos? É capaz. Mas não é a causa que deve ser maltratada quando não há nada de errado nela!

 

Vamos lá comprar as guerras que valem a pena serem compradas e deixem lá as pessoas terem os seus estereótipos que, na verdade, não são mais do que consequências das suas próprias vivências!

 

Ah! E mais AMOR! Nem tudo o que se diz tem como propósito a ofensa alheia.

Qua | 31.05.17

Analógico.

Catarina Duarte

A minha prima contou-me que, lá no sítio onde está a fazer Erasmus, num dia em que fotografava em analógico, se cruzou com um senhor já antigo, que se dirigiu a ela visivelmente feliz por ver alguém tão jovem com uma máquina tão antiga entre mãos.
Rodeou-a durante um bom bocado, acarinhou o discurso e consigo imaginar o resto: a minha prima, com o seu sorriso sincero e os seus olhos verdes, embalada pela honestidade do senhor de idade, de certeza que sorria. Com timidez e cerimónia, o discurso fluiu e disse-lhe, então, o senhor de idade, que gostava muito de ter sido fotógrafo e que tinha pena de já não ir a tempo de concretizar esse sonho. Não sei quem era o senhor belga que a abordou, não sei qual a idade que o seu rosto cansado escondia mas, após ouvir esta história, fiquei ainda com mais certeza que jamais serei aquela voz arrastada pelos anos: a voz de alguém que se cruza com a juventude, com a desilusão da não concretização de um sonho estampada no seu som.

Jamais.

Seg | 29.05.17

Workshop - Escrita Criativa - Livraria Ler Devagar

Catarina Duarte

Comecei a dar Workshops de Escrita Criativa, devo confessar, um bocado a medo.

Estava segura dos meus conhecimentos, isso era certo, sabia que tinha a ver comigo o formato destes Workshops, mas não tinha propriamente grandes expectativas relativamente ao quanto realizada dali podia sair.

Depois foram aparecendo grupos como este e, bom, posso dizer que bendita a hora em que tomei esta decisão.

Vou abrir uma data para breve – por isso, a todos os interessados: enviem e-mail para escritacriativainfo@gmail.com.

 

Workshop 27052017.jpg

 Obrigada.

❤︎

Qui | 25.05.17

(falta de) Realismo de Mãe.

Catarina Duarte

bebes.jpg

 

Na maternidade, há muita coisa que me perturba. E (juro), na maior parte das vezes, nem são os filhos (se era nisso que estavam a pensar)!

 

Na verdade, agora que penso nisso, nem é na maternidade em si. É na forma como algumas mães se comportam.

 

Não vou entrar em grandes detalhes – se quiserem muito, mesmo muito, uma análise esmiuçada dos comportamentos desviantes de algumas mães, é só pedirem – vou-me, simplesmente, focar na falta de noção de algumas mães.

 

A verdade é que há filhos que, para as (suas) mães, representam a personificação de Deus na terra. Sim, de Deus. Ele é, então, o filho, claro está, nas palavras da própria, simplesmente PER-FEI-TO.

 

Juro que tenho dificuldade em compreender a falta de realismo de algumas mães.

 

Gosto de pessoas diretas e que, sem deslumbramentos, dizem de forma franca: este meu filho é tudo para mim mas, vamos ser sinceras, não tem jeitinho nenhum para desenhar.

 

Não se enganem: aceitem que o vosso filho não tem jeito para desenhar! Ganhamos todos: até nós, amigos queridos, que não temos que nos conter perante um desenho ridículo (vamos combinar: traços aleatórios, às cores, numa folha branca, não conta como desenho, ok?).

 

É bonito quando, na beleza que consiste ter um filho, se tem o discernimento para entender que o amor não é cego. Não é cego e o realismo de mãe é algo que – lamentavelmente - não se ensina nos cursos de preparação para o parto (digo eu, que nunca frequentei nenhum!), mas que devia ser um módulo obrigatório!

 

#prayforrealismodemãe

Dom | 21.05.17

Cheiros.

Catarina Duarte

Lembro-me de ver a minha avó fumar e não é assim uma imagem tão vaga, esbatida pelo passar dos anos, como possam pensar.

Recordo-a muitas vezes, encostada ao sofá que cortava a sala, com o cigarro a queimar na borda do cinzeiro. Na verdade, lembro-me mais de ver a minha avó a acender cigarros do que a fumá-los. O cheiro do cigarro a tombar, a cinza a descair, o fio do fumo a circundar o ar.

É difícil explicar aos outros, aos que não conheceram a minha avó, a razão pela qual gosto tanto do cheiro do tabaco.

É difícil explicar a força que os cheiros têm na nossa recordação. Mas têm. Têm sempre.

Ter | 16.05.17

Os nossos heróis.

Catarina Duarte

salvador-sobral-eurovisao-1-925x578.jpg

 

Comportamo-nos como aqueles pais que maldizem os filhos que se portam e respondem mal.

 

Estamos sempre a refilar porque somos preguiçosos e desenrascados, encostamo-nos à sorte e esperamos pelo "tudo se faz". É sempre assim.

 

Não gostamos da nossa forma fácil e leviana de viver, com álcool e mulheres, como disse o outro, mas não conseguimos viver de outra forma.

 

Dizemos mal deste nosso estilo de vida mas não admitimos que nos apontem o dedo. 

 

Somos assim: maldizentes mas orgulhosos.

 

Numa fase inicial, quando o Salvador se apresentou, poucos foram aqueles que conseguiram ouvir a beleza da música “Amar pelos dois”. Ou, porque tinha tiques de aleijadinho, como li algures, ou, porque a música, lisa e crua, não era música para o festival da Eurovisão.

 

O casaco, a barba e o cabelo, os olhos esbugalhados e as mãos enroladas não ajudavam à festa - as críticas foram mais do que os aplausos, “lá vamos nós fazer mais uma figura triste”, ouvia-se.

 

O que é certo é que o Salvador foi passando e que a legião de fãs foi aumentando. Os tiques passaram a ser secundários, a música foi entrando no ouvido e já não podíamos ouvir dizer mal o nosso menino. A música escolhida, de uma beleza e suavidade ímpar, começou a fazer parte. A fazer parte de nós.

 

No passado fim-de-semana, lá rumamos ao aeroporto, numa procissão de fazer doer a alma de amor. Esperamos pelo nosso herói, como já esperamos por tantos outros, pois, na verdade, são sempre heróis, todos aqueles que nos representam e que levantam de novo aquele esplendor único que é o de Portugal.

 

São sempre heróis, todos aqueles que esbanjam a palavra em português, que espalham o calor da nossa língua que, claro, é única como qualquer outra, mas que, para nós, portugueses, embeiçados pelo que temos, tem aquele enrolar bom, que a torna ainda mais especial. 

 

São sempre heróis, todos aqueles que quentes, íntegros e certeiros, tal como a música do Salvador, choram e vibram e que, longe dos fogos de artifício desta vida, não manipulam nem ofuscam, com luzes fortes, quem os está a ver.

 

Bonitos, reais e concretos – sem sermos lamechas. Esta música somos nós. Precisamos de mais Salvadores, de mais Luísas e de mais amores. Precisamos de mais Éders, de mais futebol e de mais vitórias. Estamos no bom caminho – isto sabe tão bem!

Estamos a vincar a nossa identidade sem entrar no caminho que todos seguem.

 

No final, lá mesmo no final, muito provavelmente vamos concluir que, sem sombra de dúvida, chegamos para amar por todos. 

 

E isso é tudo.

Pág. 1/2