As pessoas dos retrovisores parecem-me diferentes.
No trânsito, parados ou encostados com os quatro piscas: estamos sempre dançando com os outros carros, viaturas que escorrem estrada abaixo e deslizam estrada acima.
Parecem-me sempre diferentes, com vidas opostas à minha, com vidas opostas às nossas: talvez até tenham as mesmas rotinas do que nós, talvez até cumpram os mesmos horários, talvez se dirijam aos mesmos locais, talvez, até, se amassem com as mesmas miudezas do que nós, mas não deixam de ser apenas pessoas anónimas, diferentes, distantes.
Analisando a cru, distanciando a verdade, as vidas destas pessoas sem nome, que se passeiam pelos mesmos passeios, que rolam pelas mesmas estradas, que param nos mesmos semáforos, as vidas delas, destas pessoas dos retrovisores que todos os dias vemos, que, até, todos os dias reconhecemos, são sempre, esmagadoramente sempre, mais iguais entre elas, mais iguais entre as nossas, do que achamos possível serem.