Mulheres de Atenas e o politicamente correto.
Hoje em dia, colocam-se, sistematicamente, entraves a quem cria e, vou-vos já dizer o final, vamos acabar todos padronizados no mesmo intervalo de coisas que nos permitem fazer, dentro daquilo que é aceitável como politicamente correto. Tenho pena: é pela diversidade que cresce a Cultura e, claro, o Homem.
Possivelmente, nunca aqui o disse, mas sou uma apreciadora de música brasileira sem qualquer complexo ou pudor. Papo tudo: desde funk, a Bossa Nova. Caetano, Chico, Elis, Bethânia, Vinicius, todos, todos. Só não os trato por tu porque consideraria desrespeitoso, apesar de, aqui, um único nome ser aceite porque, de resto, também é compreendido a quem me refiro.
No que toca à música Bossa Nova, o que sempre me fascinou foi a união da simplicidade das letras com a tranquilidade da harmonia (não tenho qualquer conhecimento musical – estou a falar bem?). Uma fusão perfeita. Reconheço que é preciso alguma paciência para ouvir Bossa Nova. Mas eu tenho-a.
As mensagens são passadas de forma clara, sem fogo-de-artifício, como muito bem diria o nosso Salvador Sobral, porque não é mesmo isso que procuramos quando queremos passar uma ideia: a simplicidade é fundamental quando pretendemos que nos ouçam.
Há pouco tempo, dei por mim a ouvir com outros ouvidos algumas músicas da minha vida. Um exemplo disso foi a “Mulheres de Atenas”, de Chico Buarque, de 1976, música rasteira na melodia, com mensagem clara e aquele inconfundível timbre carinhoso. Tudo aquilo que sempre me apaixonou quando ouvia Bossa Nova. Só que algo aconteceu.
Concluí que andam mesmo a sujar os meus ouvidos. Era mais inocente quando, há uns anos, ouvia música, não estava sensibilizada para aquilo que era aceite e permitido. Tudo era aceite e permitido porque não havia limites para o que se pretendia criar. Nunca olhei para “Mulheres de Atenas” e verifiquei uma letra machista. E isso aconteceu agora.
“Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Vivem pros seu maridos, orgulho e raça de Atenas”
“Quando fustigadas não choram
Se ajoelham, pedem, imploram
Mais duras penas
Cadenas”
É uma pena os juízos de valor que se fazem. Uma música destas não seria permitida hoje.
Perde-se a arte. Nada se ganha.